[* clique na foto para ampliar]
Durante todo o processo de troca de e-mails com a repórter, fotografias e entrevista, eu fui cética com relação à minha participação nessa matéria - o que um blog todo em português vai fazer numa reportagem sobre food blogs da cidade? Não tenho a resposta, mas no final gostei muitíssimo da reportagem feita pela simpática Claire St. John. Estou no suplemeno Sunday do jornal The Davis Enterprise [sem link online, infelizmente], acompanhada de outros quatro talentosos food bloggers de Davis.
São situações difíceis de se explicar. No inverno, por exemplo, eu sinto frio. Muito frio. Eu tremo, eu suo no suvaco de tanto frio. Tenho frio nos pés, no pescoço e nas mãos. Demoro pra esquentar. É um horror, todo inverno, todo inverno. Outra coisa é que todo dia eu sinto fome, especialmente no período entre nove e doze e cinco e sete. É uma fome irritante, que me faz descontrolar e comer coisas idiotas como um sanduíche de peanut butter, ou só a peanut butter com a colher. Nessas horas eu também devoro pizzas, e pão, e queijo, e banana. É um horror, não consigo me conformar! E tem ainda esse negócio esquisito de toda noite eu ficar cansada, sentir sono, querer deitar e dormir. É uma coisa mais forte do que eu. Minha cama tão aconchegante, macia e quentinha me chama - vem, vem, vem. Eu não consigo resistir. Deito, me estico e durmo muitas horas. É um horror, toda noite é a mesma história, toda noite, toda noite!
Desde que voltamos à trabalhar no três de janeiro que o quiosque de recepção, onde ficava a pequenina secretária, está vazio. Eu sou meio cabeça de vento e também não costumo entrar pela porta da frente, sem falar que tenho pouquíssimo ou nada a ver com a área administrativa do programa, por isso só fui notar a ausência dela quando avisaram num e-mail que ela não tinha regressado dos feriados de final de ano. Numa reunião do nosso grupo de tecnologia, fomos avisados que a mocinha certamente não vai voltar. O certamente é um certo incerto, pois na verdade não há informação. Eu perguntei meio sem graça de parecer enxerida - o que aconteceu, ela teve um acidente ou ninguém sabe? A resposta foi, ninguém sabe.
Pra mim isso é material pra roteiro de filme. Ela saí no feriado prolongado e não volta. Ninguém sabe o paradeiro. Ninguém! Será que ela fugiu com alguém procurado pela lei, está tentando atravessar a fronteira do Canadá ou México, dirigindo há semanas num El Camino azul turquesa conversível, comendo junk food, dormindo em motéis, ligando pra família em segredo de telefones públicos no meio do deserto? Drogas? Sexo? Rock 'n' Roll? Ela era uma pequena mulher, loirinha, tatuada, tímida, sempre de salto alto, estranha, como todos nós somos. Nada incomum, nada que pudesse antever o fato que um dia ela iria simplesmente se escafeder.
Tô sabendo que não se deve dar ouvido às matildes, que um cachecol de lã é peça útil no inverno, que em boca fechada não entra mosca, que seguro morreu de velho, que nós tomamos decisões que afetam inexorávelmente o nosso destino, que amizades nascem e morrem todos os dias, que nada é impossível ou imutável, que o café deve ser forte, que devemos sempre dizer obrigado, mas que não precisamos, nem devemos engolir sapos. Tô sabendo que este ano será um casulo verde, que vou me retirar do cenário, talvez não chova na minha horta, mas isso não quer dizer que não vou ver tudo flores. Tô sabendo que certas roupas pinicam e incomodam, que é normal se irritar, que é saudável chutar latas e depois comer chocolate, que chorar é bom, mas que ninguém precisa ficar sabendo.
"To be or not to be?
That's the motherfucker question!"
Ha ha ha! Eu sei que se ela ler isso, vai entender a piada e rolar de rir, me mandar muitos pisc, pisc, pisc, e me dizer coisas que vão me fazer rir ou ficar ohmaigod! É da sua contagiante e espontânea risada - ahhh, minha querida fezoca - que eu vou me lembrar sempre, sempre. So long my dear friend, be well, be happy!
Está frio, muito frio e o aquecedor portátil estava cozinhando parte da minha bunda e perna de um lado só. Então subi, vim escrever do desktop. Eu não fazia isso há anos - sem brincadeira! Estou viciada na mobilidade e conveniência do laptop. Mas quero contar o meu dia, que foi assim, competindo com os gatos:
4:50am - acordei com o despertador. escuro, frio, um barulhão de vento, temperatura caindo, caindo. fiz um pequeno bowl com aveia, leite e banana em rodelas, comi acompanhado de meio copo de suco de tangerina e duas torradas francesas. li blogs e notícias na cozinha, com o aquecedor esquentando as pernas, ouvi o vento, temperatura caindo, caindo.
6am: fui tomar banho, me arrumei, roupa quente, hidratante, perfume, batom.
6:30: tomei os quatro comprimidozinhos: 1 de 4mg dilaudid, 2 de 30mg halcion, 1 de 25mg phenergan. subi, coloquei o despertador para as 7:55am, deitei na cama, me cobri, apaguei.
8am: ouvi ele me chamando, vamos, Fer! levantei, passei batom, coloquei as botas, casaco, cachecol, entrei no carro, apaguei.
Lembranças nebulosas: estrada indo para Vacaville, consultório do dentista, recepção amigável, quer ir ao banheiro, branco, como está, senta aqui, dentista simpático, tudo bem com você, e o dente, tudo bem, estou com sono, vai ser só uma picada, vira a cabeça pra esquerda, branco, abre a boca bem aberta, branco, branco, branco, tudo bem, agora você vai ver sua dentista, branco, branco, branco, chegamos, Fer, visão da garagem, ele me apoiando, deitei na cama de roupa e tudo, uma caixa cheia de batata frita, põe o guardanapo assim pra não fazer sujeira, não esquece que não pode mastigar daquele lado, tá, comi as batatas, não tomei o remédio, não liguei a tevê, olhei o relógio - quase meio dia. apaguei.
4:50pm: acordei de um sonho, desci, fiz café com leite, torrada francesa com manteiga, suco de laranja. toctoctoc, a inquilina vem fazer uma pergunta sobre o provedor de internet, tudo bem, você está com uma cara cansada. acabei de acordar e tomar o meu café da manhã.
É sério - se eu ver, hoje ou amanhã, alguém vestindo camiseta ou chinelo de dedo, vou gritar!
Acho que tenho uma mentalidade infantil para algumas coisas, pois achei super engraçado e tive que comprar essa almofada de rato morto para o Roux. Fiquei rindo que nem boba na loja. Trouxe pra casa toda entusiasmada com o feito, pensando que iria ser hilário ver o Roux aconchegado nela. Mas quem disse que o gato tem a mesma opinião que a minha? Ele simplesmente se recusou a sentar-se na almofada e tem ignorado completamente a presença do rato morto numa de suas cadeiras prediletas. Joguei até um pouco de catnip em cima do rato, que é o que eu faço quando compro um scratching post novo pra ele, mas mesmo assim nada! Estou desapontada, esse gatonildinho não tem senso de humor!
É dia de Reis e este ano eu não tenho nenhuma romã para fazer a simpatia de muito dinheiro no bolso, que é a única que eu faço. Também guardo os enfeites de Natal, desfaço a árvore, caso ela tenha sido feita. É um ritual de fechar um ciclo, encerrar um período, que sinceramente é sempre um alivio.
Adoro sábados pela manhã, sentar em algum lugar confortável na casa com o laptop no colo, lendo, lendo. Me resta as leituras virtuas, pois as reais ainda estão de férias por tempo indeterminado. Eu não suporto usar óculos.
Estou lutando contra uma gripe, que me derrubou na quarta-feira. Pedi arrego e fui embora do trabaho mais cedo. Fico doente uma vez por ano, e preciso de duas semanas pra me recuperar. Meus dentes doem.
As visitas se foram e é sempre melancólico dizer tchau. Mas eu posso afirmar que todos aproveitaram, nós, eles, até os gatos. De volta à vida normal, sem visitas, sem enfeites de Natal, e se tudo correr bem, em breve, sem gripe.
Não vi nada, não senti nada, não lembro de nada, não fiquei tensa, não chorei, não suei, não tive peripaques, não falei nada, não reclamei, não me estressei, não sofri. Nunca mais quero sentar numa cadeira de dentista sem a ajudazinha dessas pilulazinhas. Foi uma viagem de primeira classe e eu adorei!
Depois de dias, semanas, com um panorama deserto, o campus se encheu de gente e bicicletas. Reparo no visual alto inverno coletivo, apesar que vejo, de boca aberta, aqui e ali um chinelinho. Cuidado para atravessar as ruas - se conseguir. Cuidado na direção da bike. O cachecol desenrola, não perca a luva nem a hora, que névoa, que frio. O ano começou hoje.
Foi assim super rápido. Ainda lembro dos meus pais comemorando Bodas de Prata. Hoje é a nossa vez. Me belisca, é isso mesmo? 25 anos? Como que eu nem vi esse tempão passar?
Eu não faço mais resoluções. A última que fiz, anos atrás, quando decidi em favor das relações com reciprocidade, eu ainda mantenho. Tem coisas que são essenciais e bastam. Mas hoje decidi sem mais nem menos fazer uma resolução nova, que será a de não deixar este espaço tanto às traças. Ficou bem claro que o meu amor maior é hoje este cantinho aqui, que como em toda casa, recebe e acolhe as conversas mais animadas e gostosas. Mas esta sala de estar também merece ser mantida, arejada, renovada, e então tá decidido, porque pra mim essas resoluções podem ser escassas, mas eu não deixo falhar!